Só por mero preconceito Se fala indirectamente Com quem se encontra sujeito A nos ter sempre na mente... Não sei bem se por amor Por carinho ou devoção Perdemos o coração Por quem nos faz sentir dor. Esta chama exuberante Que incendeia o nosso peito O teimoso preconceito Quer matar a cada instante... Não é uma boa lida Aconselhar toda a gente Sem nos olharmos de frente Perguntando de seguida: Que quero fazer da vida Cerrando tanto os meus olhos Que sem ver piso os escolhos Que podem causar ferida?
Quando me chamam maluco Nunca sou surpreendido Porque de são e de louco Todos nós temos um pouco Nem sequer fico ofendido. E se dizem que sou doido Nunca faço espalhafato Nem a quem diz contrario Apenas olho e me rio Na cara do insensato. Sou tão são e sou tão louco Como qualquer criatura Somente um pobre coitado Que se ache sempre ajuizado É maluco e não tem cura. Dizem certos relatórios Que entre nós em Portugal Há muitos analfabetos E outros que são pouco espertos Mas é mentira afinal... Somos um povo de sábios Que a olho nu sabem ver Quem é louco ou tem juízo E nem sequer é preciso Saber bem ler e escrever!!!
Como quem anda ao rebusco Apanhei a tua mão Na minha senti o susto E o tremer da tua agitação. Sem qualquer movimento brusco Permites já resignada A segunda mão poisada Sobre o teu airoso busto. A voz gritante dos sentidos avança com rapidez Perdem toda a lucidez Os corpos no chão cingidos. Entra por sorte na conta O querer dos dois amantes Não somente os impulsos instantes Duma acção inócua e tonta. No céu resplandece o azul assombroso As árvores peneiram o sol entre os ramos De nós e em nós derramamos O lio de todos mais precioso!
A minha mãe é uma princesa Uma princesa de verdade Não que seja da realeza Mas porque é feita de bondade. Quando me lava veste e penteia Fala-me sempre com brandura Diz-me tudo com duçura Olha-me com olhos de lua cheia. Gosta de brincar comigo Fica feliz se me vê a rir Presta atenção ao que lhe digo Canta para me deixar dormir. A minha mãezinha como eu a adoro! Ela nunca me trata mal Quer eu ria quer eu chore O seu amor é sempre igual. Quando adoeço muito activa Tudo faz para não me ver sofrer Parece capaz de morrer Para me dar a sua vida!
Sobre a fina areia da praia O sol na imperceptível subida Sem ter tirado ainda a saia Estende-se descontraída. Algo prende o meu olhar Que por ora não identifico Não sei se por admirar Ou se por achar ridículo. Destraidamente abstrato Sigo as calmas águas do mar Mas no momento imediato Prende-se de novo o meu olhar. O que houvera pressentido Agora se mostra evidente Ali mesmo à minha frente Só com um biquíni vestido. Dois tesouros duas relíquias O mar e uma mulher linda O amor e as horas idílicas A saga humana infinda!
Fosse minha a tua mãe Como eu seria feliz Que a minha não me quer bem Se afirmo ela não me contradiz. Quem tem uma mãe tem tudo Eu tenho e não tenho nada Nunca foi pessoa amada Mesmo quando era miúdo. Ter uma mãe emprestada Se calhar será melhor Do que ter o desamor Duma mãe desnaturada. Não será uma moda louca Vermos que cada vez mais Os filhos se agarram aos pais E as mães a um cigarro na boca? O pai cuida do filho com jeito maternal Enquanto a mão observa despreocupada Da mãe que era tudo já não resta quase nada Após o corte do cordão umbilical. Faz pena e causa muita tristeza Que a mulher por sua iniciativa Perca a sua maior riqueza Prescindindo da sua maior prerrogativa!
Quando não faz muito vento nem frio Gosto de ler sentado à beira-mar Erguer os olhos e ver algum navio Que vá a partir ou venha a chegar. Três casais de melros quando é tempo Constroem cada um em sua parte Ninhos que são puras obras de arte Resistentes quer à chuva quer ao vento. Ao fim de catorze dias de choco Eclodem dos ovos os filhotes Que após catorze dias já grandotes Deixam o ninho agora um depois mais outro. As primeiras horas são cruciais Para a sobrevivência destas crias Que alimentadas pelos pais Já voam bem passados poucos dias. Outra postura já vem a caminho Fazem três em cada ano Usar mais uma vez o mesmo ninho Também pode fazer parte do plano. Bancos de jardim e livros de leitura Árvores pássaros e ninhos Porto de Mar águas e navios São as premissas duma pequena aventura!
Batem na escura muralha uma a uma As ondas salgadas da foz Por entre o rendilhado da espuma Chega o marulhar da sua voz. São tantas as voltas que dão Até chegar ao seu destino! Na margem após rebentação Oferecem um bordado lençol de merino. Ora se elevam muito alto Enroladas numa esbelta curvatura Ora se lançam num grande salto E se convertem numa suave planura. São as águas dum rio maravilhoso Que na foz se juntam com as do mar No imenso abraço amoroso Da baía que se alarga para as acoitar!
Árvores ao longo dos caminhos Num descampado solitário Parecem dizer-me segredinhos Ainda longe do campanário. Os sinos lá nas alturas Começaram a badalar Acorrendo muitas criaturas À igreja do seu lugar. Com sinceras rezas e rezinhas Os devotos crentes agradeciam A muitos santos e santinhas Os milagres que por ali faziam. De repente soaram os trovões Com um ribombar premente Sobressaltaram-se os corações Qual deles o mais temente...