Este azul do rio Sado
Em Lisboa eu não vejo
Nas águas do rio Tejo
Dito muito iluminado.
A encosta imponente
Mira a baía do rio
Cuja planura é frequente
Do Outono ao estio.
Uma poupa sobre a relva
Um espécime pouco visto
Entre as ervas uma acelga
Pormenores que registo.
O cheirinho a alfazema
Tal como o do alecrim
Que vêem deste jardim
Dizem que andar vale a pena.
Onde quer que tenha ido
Tudo é sempre como novo
Nada é jamais repetido
Na cidade ou no povo.
Caminhando e rimando
Sobre o que o olhar alcança
Renovo minha esperança
Nos dias que vão chegando!
Nestes dias friorentos
Em que a chuva nos dá tréguas
Torno as jornadas mais quentes
Percorrendo muitas léguas.
Com o Sol recofortante
A bater-me bem no rosto
Ainda sinto mais gosto
No meu caminhar constante.
Reparo sempre nas plantas
Assim nunca me aborreço
Sei o nome de umas tantas
De muitas mais desconheço.
Temos aqui uma euforbia
Mais além vejo uma ficus
Entre nós não há discórdia
Prantas e eu somos amigos.
Eis também o saramago
Logo a seguir a margaça
É tão grande a sua graça
Que valem como um afago.
Últimos que são primeiros
O braço do rio Sado
Com seus múltiplos lameiros
Que vemos por todo o lado!
Antes até me aprazia cantar
Hoje impera apenas a solidão
Nada há que valha a pena recordar
Nem sonhar com os dias que virão.
Olho o céu a tocar o horizonte
Tentando ver além do infinito
O passado não tem sido bonito
Pode ser que o futuro o confronte.
Passei a vida sem me aperceber
Que o tempo passa sem darmos por isso
Não é por obra de qualquer feitiço
Que a angústia tomou conta do meu ser.
Esvaiu-se tudo aquilo que era belo
As coisas lindas andam em desnorte
O bem caiu aos pés do mal em duelo
A esperança já resta só na morte!
Um dia li no teu olhar
Um desejo que não dizias
Desde então vivo a esperar
Que faças outros dos meus dias.
Acordo muito sorridente
Se o sonho é sobre o teu olhar
Feliz porém serei somente
Quando for mais do que sonhar.
Sendo ela a última a morrer
A esperança trago comigo
Ainda havemos de viver
Esse desejo que persigo!
Não poderei viajar
Após tanta austeridade
Só me resta passear
Aqui pla minha cidade.
Avenida Belo Horizonte
Actividades no cais
São uma ótima fonte
De vistas senhoriais.
Reconhecer à distância
Prédios que rompem o céu
Tem alguma relevância
No dia a dia que é meu.
As inúmeras estradas
Que percorro no Concelho
Dizem-me que não estou velho
Para longas caminhadas.
Dialogo com as ruas
Travessas e avenidas
Quer as minhas quer as suas
Não são conversas perdidas.
Se a via não tem saída
Um atalho ou escada
Levam em menos de nada
À direcção pretendida.
Na companhia da flora
Assim como de animais
Lá vou indo estrada fora
Entre soutos e pinhais.
Às vezes do lado inverso
A paisagem parece outra
O olhar fica disperso
E a confusão não é pouca.
Uma lonjura à primeira
É sempre muito comprida
À segunda e à terceira
Já fica mais reduzida.
Sob o céu que nos abriga
Mais o Sol que tudo aquece
Caminhar traz a fadiga
Que somente me enriquce!