Perante toda esta água
Tão azul e muito lisa
Se trazia alguma mágoa
Sinto que já se ameniza.
Sobre o espelho da baía
Gaivotas em ritual
Fazem muita gritaria
Como é de seu natural.
Atracado na foz do rio
Vai recebendo a sua carga
Um gigantesco navio
Ao passo que um outro larga.
Da imensa vastidão
Até onde a vista alcança
Me aconchega o coração
Uma brisa de esperança!
Esta chuva miudinha
Molha o tolo e toda a gente
Deixa a roupa ensopadinha
E há quem fique até doente!
Cai dumas nuvens pardacentas
Que não deixam o Sol brilhar
E passam as horas tão lentas
À espera de a ver abalar!
Mas se o Sol brilhar finalmente
Ainda que por lapso breve
Ficarei eu assaz contente
E o meu pesar muito mais leve.
Sob a chuva e o Sol e o vento
O mal e o bem andam a par
Vivem pessoas ao relento
E muitas outras no seu lar!
Interrogo-me sobre o meu destino
Que se apressa em direcção ao fim
Esforço-me porém não atino
Com saber o que vai ser de mim.
Poucas as alegria o negrume
Adensa-se com o correr do tempo
Pouco mais sendo do que queixume
A vida perde-se qual cinza ao vento.
Resta a esperança é fácil dizer
Mas se esta já se encontra morta
Não há janela ao fechar-se a porta
Nada mais resta senão sofrer.
A morte será sempre nefasta
Só a vida poderá ser bela
Mas quantas vezes não é ela
Em vez de mãe uma madrasta?
Diga-me lá quem souber
Como ter serenidade
Conjugar dor e prazer
E ser feliz de verdade
Deixar abalar a alma
A seguir o seu instinto
Não perder jamais a calma
Ao cair num labirinto
Olhar o mundo e concluir
Que acharemos o seu fim
Nunca por nunca desistir
De tornar bom o que é ruim
Fazer do sonho uma arma
Que derrote a malquerença
Ter ainda boa presença
Quando a sorte nos descarna
Descortinar a ilusão
Quando seja traiçoeira
Não cair na ratoeira
De ceder à presunção
Desmascarar o cinismo
Oculto em palavra mansa
Nunca perder a esperança
Mesmo à beira do abismo
Perdoar uma traição
Que fere até às entranhas
Resistir à tentação
De proceder com artimanhas
Encararmos o devir
Sem deixar cair os braços
Podermos sequer sorrir
Se a vida nos tolhe os passos?
Ergo os olhos e reparo
Que há no céu muito nublado
Nuvens negras de braço dado
Com outras de tom mais claro.
Lembram o Março marçagão
Com as manhãs de invernia
E um Sol mais de verão
Já depois do meio dia.
Na Natureza procuro
As defesas que me faltam
E consigo erguer um muro
Contra os medos que me assaltam.
Na Natureza eu encontro
Uma força especial
Que me ajuda a vencer o mal
Com que por vezes me defronto.
Ao ar livre me sinto bem
Dialogando com o que vejo
Como quando abraço alguém
E lhe dou um longo beijo!
Hoje já é outro dia
Como dizer-se é costume
E tal como eu queria
Outra ideia veio a lume.
Conforto embora fugaz
Trazem-me os versos que faço
E são como que um abraço
Amigo em tempo de paz.
As palavras vão chegando
E aos poucos arrumadinhas
Elas falam de coisas minhas
E das que vou observando.
Não há palavras forçadas
Todas chegam livremente
Algumas já alinhadas
Como se eu estivesse ausente.
Lanço ao céu o meu olhar
Vejo que se mostra azul
E enxergo também o mar
Que se estende lá pra Sul.
Pequenas ondas vão brincando
Ao vento que sopra leve
E criam de vez em quando
Espuma branca de neve.
Ao longe no horizonte
Há nuvens cor de zarcão
Protejo os olhos com a mão
Que o Sol me bate defronte.
Não são de literatura
Os meus versos eu convenho
Mas na sua urdidura
Talvez haja algum engenho!
Finalmente me chega uma ideia
Ao meu hábito de rimar
Por mais que a rima seja feia
Não deixará de me ajudar.
Caminho todos os dias
E ao rimar em tais andanças
Me afasto das arrelias
Que me ferem como lanças.
Caminhante persistente
Trato o corpo ao caminhar
E exercito a minha mente
Pondo as palavras a rimar.
Corpo mente e a Natureza
Uma boa trilogia
Neste tempo de incerteza
Um remédio que alivia.
Para mim hoje será
Um dia de boa hora
Venha amanhã oxalá
Outra ideia como agora!
Dos que se queijam de enfado
Muitos são meros casmurros
Bem pior é o seu fado
O triste fado dos burros.
Falar muito é condenável
Um defeito a combater
Contudo acham aceitável
Saber pouco ou nada ler.
Quanto à escrita nem se fala
Não tratam dos seus papéis
E as leituras são cruéis
Porque não entendem nada.
Rejeitam a companhia
Dos que nem são maus sujeitos
Mas com os próprios defeitos
Vão vivendo em harmonia...
A águia gloriosa de Lisboa Na sua muda intrépida de pena Está a cada dia mais pequena Quer voar mas já pouco ou nada voa. Dela dizem que ainda paira alta Os adeptos que não conseguem ver Que a águia a pouco e pouco anda a morrer Para entrar num caixão pouco lhe falta. Tirai a vossa águia da agonia Deixando de estar presos ao passado A glória nasce sempre no relvado Mas nunca em qualquer secretaria. Que a águia ponha os olhos no dragão Nada ganha batendo asas à toa De novo sobre as torres de Lisboa Há-de planar firmando os pés no chão! |