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Estou aqui olhando o mar
Rio da minha cidade
Não sei quem o fez zangar
Com tanta animosidade.
Ondula-se numa fúria
Sob as rajadas do vento
tem uma cor de penúria
Que lhe vem do firmamento.
Ontem era azul marinho
E sob os raios solares
Prateava um caminho
Dos que encantam os olhares.
Amanhã já sem borrasca
Nova planície será
E a alegria que nos dá
Cada dia mais se alastra.
Amo o branco rendilhado
Desta baía tão linda
À beira do rio Sado
Eu nasci e vivo ainda!
Na tépida brilhante Primavera
Dentro de mim rebatem bem os sinos
Acordando desejos intestinos
No decorrer do tempo à minha espera...
O sazonal fermento sempre opera
Incutindo no corpo desatinos
Que toldam nos momentos vespertinos
A primaveril dócil atmosfera...
As flores aromáticas abertas
Temperam no meu ser horas incertas
Por falta de lascivas emoções.
Como a seiva das plantas verdejantes
Os odores suaves penetrantes
Nutrem as minhas íntimas paixões...
A falácia das palavras
No dizer de certa gente
Nada mais são do que aldrabas
Que enclausuram o inocente.
Se bem que a falsa ternura
E a cortezia fingida
Logrem qualquer criatura
Não será por toda a vida.
Lá diz o velho ditado
No seu julgar rigoroso
Mais depresa é apanhado
Do que o coxo o mentiroso!
Pétalas que vão caindo
Dos braços da planta mãe
Lembram cianças sorrindo
A brincar no seu vai-vém.
O brando agitar dos ramos
Da árvore que floresceu
É como um jogo de enganos
Em que ganha quem perdeu.
Cada planta com sua flor
Exalando o seu perfume
Leva recados de amor
Ao amante que se assume!
Nuvens que pelo céu correm
Entre elas o Sol emergindo
Acordam saudades que não morrem
Dum sonho que fora lindo.
Na penumbra de qualquer sonho
Rompe por vezes o futuro
O que era ainda verde e tristonho
dará um fruto belo e maduro.
Sonhar toda a gente pode
Pois não é coisa proibida
a sonhar se escreve a ode
Do sonho da nossa vida!
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Não quero pensar em nada
De antes nem para a frente
Não vou trair a jornada
Por causa do pensamento.
Observando a cada instante
Com olhar contemplativo
Dou por mim que sou amante
Do que me faz sentir vivo.
Examinando uma flor
Em busca da procedência
Se antes trazia rancor
Já só prima pela ausência.
Aves com uma plumagem
De leda policromia
Dão ao meu rosto uma imagem
Que há muito tempo não via.
Ao zumbido duma abelha
De volta à sua colmeia
Muito mais que uma centelha
De harmonia me rodeia.
O coaxar de certa rã
Anunciando o seu apego
Assinala a vida sã
A que hoje em dia me entrego!
Apenas e só um desejo
Trago na minha vontade
Receber de ti um beijo
Seja de amor ou de amizade.
Haverá maior riqueza
Do que amar sem condição
E aceitar a natureza
Duma qualquer afeição?
Não não mil vezes não
Me grita o meu interior
Quer de amizade quer de amor
Seja benvinda uma afeição.
E assim os dias lá vão
Enfiados um a um
Não sei se dias em vão
Se dias com fim algum.
Iguais não serão penso eu
Ainda que repetidos
Diferentes são sempre o céu
Os silêncios e os ruídos.
E o vento tão imprevisto
E as nuvens que vão e vêm
sendo eu um pobre de cristo
Creio no que muitos crêem.
E a esperança renascerá
Apesar dos sobressaltos
Nenhuma vida é tão má
Que não tenha pontos altos!
Pensei que era só simpatia
Na tarde em que reparei
No que o teu olhar dizia
Quando os teus olhos fitei.
Ao que havia de ternura
Outra coisa podia ser
Mas logo chegou a altura
Em que fiquei a saber.
Andava triste mas agora
Que a ti dedico esta poesia
No meu intimo já mora
Mais animado nova alegria.
As tuas mãos tal como as minhas
Vão falando por nós dois
Enquanto estão apertadinhas
Não há passado nem depois!
Se tu me desses um sim
Em vez de dizeres não
Outro seria de mim
Dentro do teu coração.
Anda um homem caminhando
Sem saber para onde vai
Passa a vida suspirando
À espera dum outro ai.
Esses esquivos sorrisos
Que assomam na tua boca
Enfraquecem-lhe as raízes
E a minha afeição se apouca.
Imerso na solidão
Dos sentimentos vazios
Me envelhece o coração
Como envelhecem os rios!